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{25.11.02}

 
IT´S TIME WE BEGAN TO LAUGH AND CRY AND LAUGH OVER IT ALL AGAIN

Leonard Cohen - So Long Marianne

Ah, a ficção e a realidade e o absurdo. Depois as pessoas me perguntam por quê eu continuo fazendo minhas referências ao Camus depois de tantos anos e no meio da porcaria da pos-modernidade. Primeiro que detesto que fala em pos-moderno como se fosse uma bandeira, o termo, o uso do pos-, a meleca toda da sociedade contemporânea é a prova que Camus tinha razão. Camus, por sua vez, mesmo quando errava, é a prova de que Nietzsche tinha razão. Já o Nietzsche é, na minha opinião, o cara que sacou a real em Parmênides. Então, sem forçar muito, temos a base da porra toda lá na Grécia pré-aristotélica.
Como todo mundo sabe que eu gosto de metáforas, deixa eu usar uma pra tentar explicar como eu entendo a do tio greguinho que dizia que "tudo é um". ... mas antes, outra micro digressão.
A micro digressão
"Tudo é um", "Eu sei que nada sei", essas frases de impacto, que vivem na memória de qualquer criatura do ocidente são uma praga e uma trava ao entendimento do que estas pessoinhas brilhantes de dois mil anos e pico atrás. O que Parmênides queria dizer de mais importante é "há uma coisa que é a base de tudo e esta coisa é A Verdade". Se seus seguidores eram na maioria loucos, a culpa não é do cara assim como a culpa das cruzadas não é de Jesus.
Fim da micro digressão
Minha metáfora para Parmênides

Um belo dia você vai numa festa e uma amiga lhe conta que está grávida. Tudo bem, você oferece seu apoio, sua compaixão, na mesma noite alguém te dá uma cabeçada na pista de dança e você corta seu lábio inferior mas o corte é pequeno e logo cicatriza. Você volta para casa e dorme um sono intranquilo (como sempre). Acorda com a ressaca das várias cervejas, sorri um sorriso amarelo, faz seus afazeres, tenta não pensar tanto no drama de sua amiga, tenta fingir que não lhe afeta (afinal o filho não é seu, ela não é sua namorada, você fez a sua parte). Mas não é a primeira vez que uma situação dessas se apresenta e você compreende como ela pode estar se sentindo ... você tem o cliché de emoções e discursos numa gaveta menos velha do que deveria da sua mente, vai lá, pega, tira o pouco pó que uns cinco anos deixam, dá uma polida e coloca ele na sua máquina de discursos. É uma placa pesada, essa do cliché da gravidez acidental que termina em aborto. Você resolve desabafar, quem sabe aquela amiga nova, menos envolvida em seus mini-dramas, então você comenta com ela que o fato te deixa meio nervoso e meio uneasy, ela responde, Moi aussi. Você não entende e pede para ela dizer "também" em relação a quê. Ela responde que está grávida e que isto também a deixa uneasy. Em segundos, você volta para aquela prateleira de clichés desagradáveis para buscar aquele que contém os sentimentos relativos a "gravidez indesejada mas terá o bebê mesmo assim". Isto acontece, por mais que as regras de escrita ficcional digam que seria um exagero colocar tudo num mesmo fim-de-semana, ainda mais naquele em que alguém disse que estava indeciso entre Bjork e Clara Nunes como música de formatura.
O que nos leva de novo ao Parmênides. A verdade é esta coisa além da capacidade de discurso humano, é uma esfera brilhante onde habita a deusa. Por que a Deusa? Porque só uma divindade teria capacidade de compreender todos os nós de aparente contradição e falta de verossimilhança que compõem a Verdade. A nossa verdade, dos humanos falhos e mortais, é a verdade dos discursos e das aparências pois o acesso direto à esfera com certeza faria nossas mentezinhas limitadas explodirem com tanta informação. Parmênides é, assim, uma espécie de cético pragmático ahead of his time, que admite a existência de uma verdade absoluta, como todos os filósofos sérios, mas admite suas limitações em conseguir alcançá-la. Se pudéssemos, talvez víssemos todas as maravilhosas interconecções de caus e efeito que fazem do universo o universo ... mas daí, a vida teria bem menos graça.


posted by Senhor K. 06:41


{18.11.02}

 
JUST A REMINDER

toda a verdade é ficção. ao menos toda a verdade a que temos acesso. daí a primeira de todas as artes ser a de contar histórias. daí todos os movimentos relevantes terem sua expressão literária.

só defendendo o meu campinho um pouco e falando coisas que fiquei pensando depois de ler o bloquinho de notas do tietzman. quer, vai lá, rtietz.blogspot.com
posted by Senhor K. 01:24


{11.11.02}

 
MUTATIS MUTANDIS

Todo o artista, ou toda a pessoa que trabalha com criação, mesmo que não artística, enfrenta problemas no caminho até o resultado final. Algumas vezes a gente até brinca, disfarçando um fato bastante real, dizendo: Incorpora na estética. A verdade é que, não raro, problemas, quando bem trabalhados, podem virar elementos simbólicos importantes no produto final. Eu andava, nos últimos dias, desesperado porque o som das entrevistas de um vídeo que estou montando havia ficado ruim, baixo e, conseqüentemente, tomado por um ruído que mais parece a turbina de um jato pelo lado de dentro. Como resolver isto num negócio sobre educação infantil para o qual já havia escolhido como música tema uma versão em violçao da Sonata ao Luar do Beethoven. A resposta estava num verso do Blur, I had my head checked by a Jumbo jet.

O ruído quase insuportável (depois da aplicação de cinco camadas de filtros, antes, insuportável mesmo) acabou se revelando uma trilha melhor pra dicotomia entre a educação dos meninos de classe média alta que estudam no Champagnat e do pessoal da vila onde tem traficantes duas quadras abaixo da porta da escola. Só é uma pena que o som das entrevistas, algumas com coisas bem bacanas, não tenha sido possível salvar. Pelo menos, e isto é o mais importante agora, a história que se quer contar, se conta.

A única coisa que me incomoda um pouco é que do jeito que tá, ficou mais cabeça do que eu queria. Isso é uma merda, porque avacalha a abrangência de público da peça.


posted by Senhor K. 05:04


{7.11.02}

 
em defesa da sutileza

ando de saco cheio de uma literatura e um cinema que tentem me vencer através de acusações de que eu fui criado como um burguês. eu não busco arte para redimir meus pecados capitalistas que nem tenho. estou cansado de cuspirem na minha cara porque eu tive educação e ter educação não é o jeito dos "verdadeiros brasileiros". os verdadeiros brasileiros precisam pagar pra uma velhota escrever cartas pra eles, vender cocaína para comprar cola, fazer o namorado comer fezes, achar que são ovos em conserva, estuprar, ser presos e morrer no pau de arara. chega. nem todas as histórias que merece ser contada tratam da vida e da morte de uma forma tão levianamente gráfica. o espetáculo que fizemos de nossas artes narrativas faz, por força de compulsão estética, esquecer os motivos que nos levam a escrever histórias pra começar.fomos dominados pela teoria da primeira impressão e, cada vez, vemos pessoas transtornadas em criar a primeir impressão mais aterradora justamente para que ela fique. bobagem. devemos ter um pouco de paciência com a verdadeira arte, deixar o sexo pro terceiro encontro, não como um one night stant fuck it all and cum in the face. vamos com calma, temos tempo. não precisamos de tantos brinquedos, que mais nos afastam nesta relação sexual entre leitor e autor, do que aproximam. é hora de uma literatura tântrica, em posição de flor de lotus, olhando um no olho do outro lentamente enquanto os corpos se acostumam com a presença mútua, até que a obra seja verdadeiramente de ambos e ninguém possa dizer que está comendo quem.
posted by Senhor K. 11:16

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